Há poucos dias, pela manhã cedo, quando estava indo para o quartel, em um certo ponto da rodovia por onde costumo passar, justamente em um local onde o trânsito normalmente fica engarrafado nos horários de maior fluxo de veículos, observei que, uns poucos metros mais à frente, uma pessoa vinha andando de uma forma suspeita pelo canteiro central, bem próximo aos automóveis que se deslocavam lentamente. Meu instinto policial imediatamente disparou o "alarme de alerta" e logo fiquei pronto para um iminente confronto (não era a primeira vez que tive a necessidade de reagir a uma tentativa de assalto).
Aos poucos ia me aproximando do "suspeito", aproveitando os segundos que me separavam dele para observar todos os detalhes que seriam importantes para a minha ação: se estava visivelmente armado, se não haviam outras pessoas próximas, etc.
Fui notando que era um rapaz alto, um pouco magro e que estava vestindo boas roupas, possivelmente de marcas famosas, apesar de um pouco sujas; aparentava ter no máximo uns 19 anos de idade.
Observei que ele estava com um comportamento muito estranho: gesticulava de forma desconexa e passou a tentar se equilibrar sobre o guardrail, como se estivesse sobre uma prancha de surf. Observei rapidamente em volta e vi que algumas pessoas estavam rindo e zombando daquela situação. Realmente seria engraçado, se não fosse trágico.
Quando cheguei bem próximo, observei que o motivo de todo aquele comportamento estranho não era loucura, mas sim as drogas. Um passageiro de um carro que vinha logo à minha frente, saltou e, com certeza comovido com aquela situação, assim como também eu estava, tentou ajudá-lo a levantar-se após uma abrupta queda, mas o rapaz simplesmente fugiu correndo em direção ao outro lado, quase sendo atropelado na pista de sentido contrário.
Na época em que eu trabalhava no BPChoque, era comum companheiros zombarem de qualquer PM que demonstrassem algum sentimento de piedade. Tínhamos que trabalhar com uma pedra de gelo dentro do peito, senão era chamado de "coração mole". Quero reconhecer que estou ficando um "coração mole".
Ao me dar conta da situação daquele rapaz, logo me veio à lembrança os meus filhos, um deles também adolescente. Sem mesmo conhecer, imaginei o drama que os pais daquele garoto devem estar passando...e isso doeu muito. Na hora não chorei, mas admito, estou muito emocionado ao escrever estas linhas, pois vejo que os perigos das drogas rondam as famílias a todo momento, e qualquer um de nós pode ser vítima deste drama.
O meu filho mais velho, somente no dia de hoje, já disse que me ama pelo menos umas dez vezes, além de mandar mensagens pelo celular. O mais novo, que ainda está aprendendo a dizer as primeiras palavras, hoje me chamou de "mô", para dizer amor.
Sei que a vida de um policial é sempre atribulada, muito trabalho e estresse; sinto isto na pele todos os dias. Ainda têm aqueles companheiros que precisam complementar o salário com os "bicos" nas horas de folga. Mas, apesar de tudo, peço a todos os policiais que estejam lendo estas linhas agora, para que não esqueçam ou menosprezem as suas famílias, principalmente os filhos, pois eles são as riquezas mais importantes que temos. Não deixem que os traficantes façam o papel de pai e levem os seus filhos para um caminho quase sem volta.